Inflação e crescimento: diferentes gerações, diferentes traumas

“Vejo o Brasil como um país que viveria os ideais do crescimento sustentável. É o lugar mais bonito do mundo e integrar o mundo natural e a economia seria uma agenda perfeita para o Brasil. Portanto, espero que um próximo governo use o desenvolvimento sustentável como um princípio organizacional para o País. Governar de forma honesta e promovendo tecnologia, que é onde a competitividade estará no futuro.”

 Jeffrey Sachs

Aproveitando minha viagem a Belém para o lançamento do livro Economia + Criatividade = Economia Criativa, o Prof. Eduardo Costa me convidou para ministrar uma aula na Universidade Federal do Pará (UFPA) para seus alunos dos cursos de Economia e de Direito.

Perguntei a ele o perfil da turma e, quando me informou que era formada, na maioria, de calouros, não tive dúvida e propus o tema Inflação, emprego e renda.

Na exposição, enfatizei o aspecto histórico, apresentando uma série de dados e gráficos de experiências inflacionárias e hiperinflacionárias tanto do Brasil como do exterior, da década de 1920 à de 1990, antes de analisar a situação atual. Como era de se esperar, a esmagadora maioria dos presentes não apenas não havia vivido, mas muitos sequer tinham conhecimento daquelas experiências.

Na sequência, apresentei os dados da atualidade, explicando que, embora a inflação de pouco mais de 10% seja preocupante, a situação é muito diferente da existente no final dos anos 1980 e início dos anos 1990 até a implementação do Plano Real. Prossegui examinando os registros mais recentes que mostram um aumento do emprego formal – ainda que o número de desempregados permaneça elevado – e a queda da renda real, constituindo um quadro complexo que deverá perdurar ainda por algum tempo.

Na fase final, destinada a perguntas, quase todas se referiam aos dados apresentados das inflações e hiperinflações de décadas passadas.

Confesso ter ficado um pouco decepcionado, pois esperava questões relacionadas ao presente e ao futuro da nossa economia. Fui, porém, alertado pelo Prof. Eduardo Costa para um fato relevante. Disse ele: “A geração que está começando o curso universitário agora, assim como a das três décadas anteriores, está traumatizada com o baixo crescimento e cansada de discutir esse assunto. Mas desconhece os dados apresentados sobre inflação, que era o assunto que monopolizava as atenções e traumatizava a geração a que você pertence. Daí o grande interesse dos alunos quando você lhes proporcionou a chance de conhecer melhor e debater o tema”.

Realmente, começando o curso de graduação em 1974, ano em que o crescimento do PIB no Brasil atingiu os 14%, fiz parte de uma geração que ainda surfou na onda do sucesso da economia brasileira que foi uma das que teve melhor desempenho no mundo entre 1870 e 1986, conforme estudo do Prof. Angus Maddison, reconhecido como um dos maiores especialistas em ciclos longos de crescimento. Até então, considerávamos natural ter taxas expressivas de crescimento e os recém-formados eram disputados pelas empresas enquanto estavam ainda na faculdade. A partir da década de 1980 o quadro se modificou totalmente e passamos a conviver com um perverso tripé que combinava estagnação prolongada, inflação crônica e pressão das dívidas (ora externa, ora interna).

A década perdida de 1980, cujo significado fica evidente na figura 1, foi seguida de outras três décadas – 1991-2000, 2001-2010 e 2011-2020 – caracterizadas por taxas de crescimento pífias, abaixo do nosso potencial de crescimento.

Figura 1 – A década perdida*

Fonte: WEFFORT, Francisco. Qual Democracia? (Cia das Letras, pág. 67)

* O índice geral, elaborado pela CEPAL, inclui todos os países latino-americanos, 
não apenas os aqui listados. Não considera os dados de Cuba porque o conceito de 
produto social é diferente dos demais.

Daí a mudança de perspectiva dos meus contemporâneos e dos economistas mais jovens.

Não há como discordar: diferentes gerações, diferentes traumas.

 

Referências

DAVILA, Anapaula Iacovino; MACHADO, Luiz Alberto; PAULA, Mauricio Andrade de; SANTOS, Sonia Helena. Economia + Criatividade = Economia Criativa. São Paulo: Scriptum, 2021.

MACHADO, Luiz Alberto. Equação complicada. Disponível em http://www.souzaaranhamachado.com.br/2022/04/equacao-complicada/.

WEFFORT, Francisco. Qual democracia? São Paulo: Companhia das Letras, 1992.