Crescendo a passos de tartaruga

 Retrocesso relativo

“Liberalismo é uma forma bastante sofisticada de o Estado intervir na economia!”

Marcos Lisboa

Como parte da intensa programação levada a cabo pelo Espaço Democrático, a fundação responsável por pesquisas e formação do PSD, foi realizada a palestra sobre “Desafios da Economia Brasileira”, ministrada pelo economista Marcos Lisboa, presidente do Insper e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda entre 2003 e 2005.

Lisboa iniciou sua palestra falando do enfraquecimento relativo da economia brasileira nos últimos 50 anos, incluindo os últimos 25, posteriores à conquista da estabilidade obtida com o Plano Real.

A tabela 1 revela claramente a perda relativa dos trabalhadores brasileiros a partir de 1994, ano da implementação do Plano Real, vis a vis países emergentes, Estados Unidos, países da OCDE e países da América Latina e Caribe.

Tabela 1

PIB por Pessoa Empregada

Nos anos que antecederam o Plano Real, o Brasil cresceu num ritmo muito inferior aos demais países emergentes (em média, 6% abaixo). Durante os governos FHC e Lula, o nosso crescimento foi inferior ao dos emergentes, porém num ritmo inferior de apenas 2%. A partir de 2010, no entanto, a situação se deteriorou e nosso desempenho foi lamentável, fazendo com que diversos outros países deixassem o Brasil “comendo poeira”.

Como razões desse retrocesso, Lisboa apontou os seguintes fatores: (i) excessivo aumento do gasto público, concentrado fundamentalmente em salários e previdência, embora o Brasil ainda seja um país com população jovem em rápido processo de envelhecimento; (ii) redução acentuada do nível de investimento; (iii) baixa produtividade dos recursos humanos.

Além disso, mencionou quatro causas estruturantes: (i) baixa educação (aprendizagem dispersa e sem foco); (ii) reduzido investimento em infraestrutura; (iii) produtividade fora da empresa (instituições eficientes); (iv) políticas e intervenções públicas que dificultam o ciclo de abertura e fechamento das empresas.

Na sequência, Lisboa lamentou a perda de tempo com os falsos debates, tais como: (i) considerar juros e câmbio fatores essenciais para o crescimento; (ii) a necessidade de regulação ou de intervenção para o funcionamento dos mercados, quando o que importa é definir quais as regras que permitem o desenvolvimento eficiente dos mesmos.

A má notícia, na visão de Lisboa, é que tudo que está acontecendo não é novo e é sobejamente conhecido. A boa notícia é que depende apenas de nós mesmos, não dá pra responsabilizar nenhum país ou instituição estrangeira pela nossa situação. Em outras palavras, a bola está conosco.

Na parte aberta às perguntas da plateia, perguntei ao palestrante como ele explicava a acentuada mudança do Brasil em termos de crescimento econômico, considerando que no consagrado trabalho World Economic Performance Since 1870, Angus Maddison, um dos mais respeitados analistas de ciclos longos de desenvolvimento, identificou o Brasil como o país que apresentou melhor desempenho de 1870 a 1986, numa amostra que reunia os cinco maiores países da OCDE (EUA, Alemanha, Reino Unido, França e Japão) e os cinco maiores de fora da OCDE (Rússia, China, Índia, México e Brasil).

Nesse estudo, publicado em 1987 e apontado pelo embaixador Rubens Ricupero (2001, p. 103) como “o mais impressionante de todos, por comparar grandes economias, portanto entidades pertencentes mais ou menos à mesma ordem de grandeza, e por cobrir duração de tempo tão extensa”, Maddison concluiu que “o melhor desempenho tinha sido o brasileiro, com a média anual de 4,4% de crescimento; em termos per capita, o Japão ostentava o resultado mais alto, com 2,7%, mas o Brasil, não obstante a explosão demográfica daquela fase, vinha logo em segundo lugar, com 2,1% de expansão por ano”.

Respondendo à questão, Lisboa apontou como principal razão o fato de que mesmo nesse longo período em que o Brasil apresentou bom desempenho, o crescimento não ocorreu de maneira regular e constante, mas sim de forma espasmódica, alternando fases de excepcional crescimento – como o do chamado milagre econômico – com outros de relativa estagnação – como na década de 1980, conhecida como década perdida, na qual, segundo a Cepal (Comissão Econômica para a América Latina), o crescimento do PIB por habitante no Brasil foi de -0,4%, como se vê na tabela 2.

Tabela 2

A Década Perdida 

1981 – 1989

Crescimento do PIB por Habitante

América Latina* (8,3) Chile 9,6
Bolivia (26,6) Haiti (18,6)
Equador (1,1) Honduras (12,0)
México (9,2) Nicarágua (33,1)
Peru (24,7) Panamá (17,2)
Venezuela (24,9) Paraguai 0,0
Argentina (23,5) Rep. Dominicana 2,0
Brasil (0,4) Uruguai (7,2)
Colômbia 13,9 Guatemala (18,2)
Costa Rica (6,1) El Salvador (17,4)
Fonte: Reproduzida do livro Qual Democracia?, de Francisco Weffort, p. 67.
(*) O índice geral, elaborado pela CEPAL, inclui todos os países latino-americanos,
não apenas os aqui listados. Não considera os dados de Cuba porque
o conceito local de produto social é diferente dos demais.

Lisboa reconheceu, no entanto, que o desempenho do período considerado por Maddison foi, em média, bem mais auspicioso do que o verificado nas últimas décadas e fez questão de insistir para a responsabilidade, predominantemente nossa, de retomar a trilha do crescimento sustentado. Para tanto, destacou as seguintes prioridades:

  • Simplificação e previsibilidade das regras tributárias
  • Estímulo à competição e redução das distorções setoriais
  • Abertura comercial
  • Maior relevância dos mercados de crédito e de capital
  • Investimento em infraestrutura
  • Política social e Reforma do Estado

Referência bibliográfica

RICUPERO, Rubens. O Brasil e o dilema da globalização. São Paulo: Editora SENAC. Série Livre Pensar, 2001.

WEFFORT, Francisco. Qual democracia? São Paulo: Companhia das Letras, 1992.