Não ganhar ≠ Perder

Existem chavões ou frases feitas que são frequentemente utilizados pelas pessoas sem que elas mesmas acreditem muito no que falam.

Em qualquer área de atividade ocorrem situações dessa natureza.

Cada internauta que está lendo este artigo já deve, a esta altura, estar buscando na memória quantas vezes passou por experiências desse tipo.

Apenas para não ficar no plano da retórica, menciono alguns exemplos desse tipo que me fazem morrer de rir quando me deparo com eles:

  • Assim que se encerra uma partida final de campeonato, alguém diz a quem acaba de ser derrotado: “o importante não é ganhar, mas competir”. Acho que só deve acreditar nisso quem nunca vestiu um calção ou entrou numa quadra esportiva.
  • Diante de uma crise generalizada houve-se de um integrante do governo: “já se vê uma luz no fim do túnel”. Imagino que seja de um trem que vem no sentido oposto para atropelar o que encontrar pela frente.
  • “Dinheiro não traz felicidade”. Deve ser por isso que ninguém faz questão de ter…

Resolvi escrever este artigo por ter passado no espaço de uma semana por dois momentos que me colocaram diante da possibilidade de efetiva comprovação de um exemplo que pode muitas vezes ser enquadrado na situação supra descrita.

A frase em questão é: “aqui não há perdedores; só por terem participado, são todos vencedores”.

O primeiro desses momentos ocorreu por ocasião do XI Fórum FAAP de Discussão Estudantil, uma simulação de reuniões de organismos internacionais preparado pelos universitários da FAAP e voltado para estudantes de ensino médio.

Realizado sempre em feriados prolongados em razão da necessidade de ocupar salas de aula e outras instalações que fora desses períodos são utilizadas em atividades regulares, o referido evento tornou-se verdadeira referência ao longo dos anos em que é realizado, a ponto de ter as vagas disponíveis preenchidas em poucas horas.

Durante os três ou quatro dias de duração do Fórum, centenas de estudantes de ensino médio participam avidamente das atividades propostas na condição de delegados dos países que lhes cabe representar. Todos abrem mão de viajar com suas famílias ou amigos para desfrutar dos dias de recesso escolar para participar do evento e alguns chegam a disputar a vaga em simulações internas que diversos colégios passaram a realizar, alguns deles inspirados no próprio Fórum FAAP.

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Numa das edições anteriores, o então vice-governador de São Paulo (e atual ministro da Pequena e Micro Empresa) Guilherme Afif Domingos fez questão de enaltecer a iniciativa daqueles jovens participantes afirmando que os considerava vencedores, pois entre milhões de estudantes que estavam naquele momento iniciando viagens de lazer, eles estavam se preparando para uma jornada de quatro dias de intensas atividades “diplomáticas”.

Um dos poucos aspectos que não obtém consenso absoluto nessa trajetória do Fórum FAAP refere-se à premiação dos delegados que mais se destacam durante o evento, assim como a da melhor delegação, que cabe ao colégio que possui maior número de destaques individuais.

Entre os professores conselheiros que costumam acompanhar os estudantes quer na fase de preparação quer durante os dias da simulação, há uma divisão entre os que são favoráveis e os que são contrários à premiação. Entre os alunos que participam, não há essa dúvida, pois veem a premiação como um dos maiores estímulos às suas participações.

Na edição deste ano, considerada quase por unanimidade como a melhor já realizada, a discussão sobre a premiação voltou à baila no encontro com os professores conselheiros, realizado tradicionalmente com os secretários-gerais.

Talvez imbuído dessa preocupação por ter acompanhado os debates a respeito do tema, prestei especial atenção às reações de todos – alunos e professores – durante a solenidade de encerramento, quando chega a ser emocionante ver o entusiasmo como todos participam depois de quatro dias de intensos debates.

Minha sensação é que embora apenas algumas dezenas de delegados recebam prêmios por terem se destacado em meio a centenas de participantes, os que não recebem não saem frustrados da experiência. Pelo contrário, saem prometendo a si mesmos que vão se preparar melhor para conquistar o “malhete” na edição seguinte.

Não se consideram, portanto, perdedores ou derrotados. E, com certeza, não o são. Na verdade, são vencedores, pois acumularam conhecimentos e relacionamentos que guardarão pelo resto de suas vidas, além de terem saído do Fórum mais maduros e conscientes.

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O segundo desses momentos envolveu meu filho, Guga Machado, cujo CD de estreia foi indicado como um dos finalistas do Prêmio da Música Brasileira, a mais reconhecida premiação existente no Brasil.

A cerimônia de premiação ocorre anualmente nas dependências do Theatro Municipal do Rio de Janeiro e desperta enorme interesse tanto do público como da imprensa. Realizada no formato da entrega do Oscar, reúne enorme número de fãs no lado de fora do teatro, que se acotovelam para ver a chegada dos artistas.

Como típico “Pai Gelol” (não basta ser pai, tem que participar), fui com minha mulher assistir à cerimônia. Além de ter tido o privilégio de ouvir alguns dos maiores nomes da música brasileira, testemunhei a justa homenagem feita à cantora Maria Bethânia por seus 50 anos de carreira.

Nos dias que antecederam à cerimônia de premiação, disse diversas vezes a meu filho que independentemente de receber ou não o prêmio, ele deveria se considerar um vencedor. Afinal, estar entre os indicados e participar de um evento ao lado de tantos nomes consagrados da música brasileira era mais do que suficiente para se considerar um vencedor.

A cada vez que falava isso, ficava em dúvida: será que ele – e eu também – acreditava nisso?

Ele não foi premiado, mas nem por isso deixou de viver e de proporcionar a seus pais um dos momentos mais emocionantes de nossas vidas, o que fica evidente na declaração que postou no facebook:

Guga no Prêmio da Música Brasileira

“Esse é o telão do Theatro Municipal do RJ. Eu acabo de não ganhar o Prêmio da Música Brasileira. E sabe duma coisa? Eu nunca imaginei passar por isso nem no meu sonho mais vitorioso. Tô com os meus amores no meio dos meus ídolos. É mais do que eu sempre sonhei. Obrigado, Obrigado e Obrigado! Mafagafo Jazz é o meu maior orgulho.”

Se eu tinha alguma dúvida da veracidade daquela frase, com certeza isso é coisa do passado. Esses dois momentos deram-me a certeza de que não ganhar é completamente diferente de perder. Tanto é que escrevi este pequeno artigo comemorando a “conquista” do meu filho, almoçando no Sensi, um dos restaurantes de São Paulo que recomendo vivamente, no intervalo entre a chegada do Rio, onde estive para acompanhar a solenidade de entrega do Prêmio da Música Brasileira e a ida para Curitiba, a fim de participar de reunião preparatória do Congresso Brasileiro de Economia, que será realizado na capital paranaense em setembro próximo.