CRIATIVIDADE

 

 

O espaço cada vez maior da criatividade

 

 

Terminei meu primeiro artigo para esta coluna, afirmando que a extraordinária capacidade de adaptação dos empreendedores paulistas – refletida na pesquisa do International Management Development Institute – IMD – era produto da sua enorme criatividade, transformada em diferencial competitivo.

E é exatamente sobre o tema da criatividade que irei me ater tanto no artigo desta semana como no da próxima. No de hoje, vou falar um pouco sobre a evolução do conceito de criatividade e do reconhecimento cada vez maior de sua importância. No da próxima semana, vou procurar enfatizar o impacto da criatividade para a conquista de diferencial competitivo.

A década de 90, última do século XX, foi chamada por muitos analistas de década do cérebro, ou de década do conhecimento, ou ainda de década da inteligência. Houve também quem a chamasse de década da criatividade. A rigor, todos estão certos, uma vez que há estreita relação entre todas essas denominações. O importante a se destacar de tudo isso é que ao chegar ao fim do século XX o homem havia se dado conta, definitivamente, da importância da criatividade para melhorar o seu próprio desempenho e, por extensão, da sociedade de uma forma geral.

O primeiro passo para tal consistiu em saber como funciona o nosso cérebro. Afinal, foi aí que tudo teve origem. O final do século XX viu o conhecimento sobre o cérebro humano deixar de ser assunto de um reduzido bando de especialistas para se transformar num assunto de interesse muito mais amplo, a ponto de se tornar matéria de capa das revistas de maior circulação no país.

Conhecendo melhor o funcionamento do cérebro, foi possível ampliar o conhecimento sobre a criatividade e, com isso, diversos tabus foram caindo:

1º) A criatividade não é um dom natural, com o qual algumas pessoas nascem e outras não Þ Todos nós possuímos um potencial criativo a ser desenvolvido, independentemente da personalidade de cada um.

2º) Criatividade não pode ser confundida com magia Þ Isso implicaria em que as pessoas criativas seriam conhecedoras de algum truque ou algo do gênero, inacessível às pessoas comuns.

3º) Criatividade também não é mistério Þ Portanto, nada de imaginar que a fonte da criatividade seja algo misterioso ou secreto.

4º) Criatividade não significa loucura Þ As pessoas criativas não precisam ser ou aparentar ser loucas ou excêntricas.

O estudo da criatividade, porém, não começou apenas no fim do século passado.  Apesar de muitos estranharem, a criatividade vem sendo objeto de estudo desde 1900, quando o francês Theódulo Ribot publicou o livro A imaginação criadora, com noções embrionárias de pessoa e processos criativos. Meio século se passou sob a denominação de “imaginação”, acompanhada muitas vezes do qualificativo “criadora”, até que em 1950 Guilford a batiza com o nome de Criatividade.

De lá para cá, as pesquisas se intensificaram, podendo-se falar na existência de três gerações de pesquisadores. A primeira, voltada para o “pensamento criativo”, enfatizava o desenvolvimento de habilidades (anos 50). Essa geração não conseguiu despertar o interesse da sociedade em geral para o tema da criatividade, por isso os estudos e eventuais avanços ficaram restritos aos limites dos consultórios e das clínicas de psicólogos e neurocientistas que se debruçaram sobre ele. A noção de criatividade esteve nessa fase associada à capacidade de fazer algo diferente. Diversas definições surgiram, sendo a que mais me agrada a de Charles ‘Chic’ Thompson,  “a capacidade de olhar a mesma coisa que todos os outros, mas ver algodiferente nela”.

A segunda, voltada para a “solução criativa de problemas”, dava ênfase à produtividade, alertando, assim, para um fato relevante para o mundo dos negócios: a criatividade pode se constituir numa importante ferramenta para a obtenção de vantagem competitiva. Para essa geração, a criatividade incorpora um fator fundamental para quem vive num ambiente competitivo, a agregação de valor. Uma visão mais ampla e detalhada deste conceito de criatividade será objeto de análise do próximo artigo.

Já a terceira geração dá ênfase à idéia da autotransformação, acreditando que uma pessoa não poderá desenvolver a criatividade, mudando a maneira de ver o mundo e de fazer as coisas, se antes ela não se transformar por dentro. Para tanto, é necessário investir primeiro no autoconhecimento; depois, uma vez estando a pessoa convencida da necessidade de desenvolver a criatividade, na autotransformação.

Passada a fase da disseminação da importância da criatividade, estamos agora entrando numa nova etapa. Como diz Saturnino de la Torre, “a criatividade foi considerada como uma atitude ou qualidade humana pessoal e intransferível para gerar idéias e comunicá-las, para resolver problemas, sugerir alternativas ou simplesmente ir mais além do que se havia aprendido”.

A etapa que ora se inicia é bem diferente e aponta para novos desafios. Um século depois de seu nascimento, a criatividade se reveste de um caráter mais amplo. É como se a passagem para um novo século significasse a celebração da maioridade da criatividade, que sai da vida familiar acadêmica para abrir-se à vida social, como em outro tempo o fizeram a educação, a saúde ou a defesa do meio ambiente. De acordo com de la Torre, “a criatividade como valor social virá marcada por um novo espírito, esta vez envolto em problemas de convivência entre as diferentes civilizações e culturas que conformam a humanidade. É preciso para isso um tipo de criatividade menos academicista e mais estratégica e atitudinal. Uma criatividade comprometida com a busca de soluções a problemas sociais, aberta à vida, à juventude, ao cotidiano”.